sexta-feira, 2 de maio de 2008

A Muda: Final Chapter

Dá-se assim por terminada a história da Muda. The red curtain must close. Muito mais haverá para contar se preservarmos a capacidade de observação e, claro, a imaginação. Que voe um abraço muito especial à senhora que, sem saber, inspirou esta narrativa. Até breve!


A Polícia Judiciária imediatamente pôs a fotografia do Gustavinho a circular no país e até em Espanha. Dois dias depois foi apanhado na Trafaria com os braços muito abertos a saltitar e gritar cucrrruuu, cucrrruuu. Coitado, deu em tolo foi o que foi. A Judiciária prendeu-o e a TVI fez saber que a responsável por aquela apreensão tinha sido a D. Almerinda, residente no rés-do-chão do número 49 da rua de Nossa Senhora das Graças, Braga.

Nos dias seguintes, todos os talk-shows falavam na bravura daquela mulher. Muda mas sem medo. Aquilo sim era um exemplo. E a capacidade de comunicação? Incontestável, Surpreendente, Nunca Vista! Os principais cronistas dedicaram-lhe os seus escritos; os locutores de rádio referiam-na constantemente entre louvores; os apresentadores de televisão não conseguiram ignorá-la e, quando viram o que a Muda trazia em share, a publicidade e a solicitação foram aumentando; vários espectadores ligaram para os programas de entretenimento a pedir a presença da senhora; notas de rodapé então nem se fala, menina. Portugal inteiro queria a Muda!

Entretanto, não sei bem como, as senhoras amigas da Muda começaram-se a organizar, a escrever cartazes e numa bela manhã abalaram todas para o Governo Civil de Braga. Queremos a Muda na TVI! Maior Participação da Muda na Vida Pública! Quem Fala Assim Não É Gago! Muda à Presidência! Enfim menina, pode imaginar as palavras de ordem. A cidade aderiu em peso! Em uníssono, Muda para aqui, Muda para ali, o singelo encontro entre as amigas da senhora transformou-se numa grandiosa manifestação nacional. Do Governo Civil alugaram umas camionetas e rumaram a Lisboa às apitadelas na auto-estrada, até deu na televisão. A Muda ia na carreira da frente, toda em proa qual Vasco da Gama em direcção às Índias. Na Assembleia da República o mesmo chinfrim! Muda Ao Poder! O Povo É Quem Mais Ordena e por aí fora.

Qual perdigueiro a farejar um rasto de carne, José Eduardo Moniz viu de imediato milhões de euros nesta manifestação popular. Prontamente a convidou para o programa do Goucha e as audiências triplicaram nessa manhã. Aplausos, muitos aplausos, infindáveis reportagens na ‘Maria’ e na ‘Mulher Moderna’, programas de televisão exclusivamente dedicados à sua vida… num instantinho a Muda passou a ser um fenómeno nacional e já com interesses declarados por parte da televisão espanhola. A tudo respondia com o seu sorriso aberto e um aceno à Lady-Di.

Depois de um mês inteiro a participar nos mais variados programas da TVI, relatando a vida de quem sabia e não sabia e mesmo partilhando anedotas picantes, veio a contratação da sua vida. Parece que o Moniz lá reconheceu que o povo não passa sem a Muda e, numa estratégia de marketing inédita, despediu o Júlio Magalhães e colocou a Muda na cadeira de pivot do telejornal todas as noites às 20h em ponto. Logo será o seu primeiro serviço noticioso!

De repente estremeci com o som metálico e irritante que saía do telemóvel do meu vizinho. Este, não estando de todo habituado a que o aparelho de facto tocasse, passou largos segundos a ignorá-lo. Levantei as sobrancelhas e apontei o seu bolso com o queixo. É o meu? É o meu? Ah, pois é… nem me lembro que tenho um destes. Emergência doméstica, que é como quem diz rotura de canos, impede-o de continuar a fitar o meu ar embasbacado. É a Ritinha, menina, tenho de ir. Diz que a cozinha está que parece uma piscina.

Enquanto o acompanhava à porta, o inquérito habitual: então quanto tempo fica desta vez? E quando é que casa, menina? Veja lá, olhe que não queira ficar para tia. Sorrindo amareladamente despedi-me e fiquei a vê-lo descer no elevador.

1 comentário:

GreenHouseSpecial disse...

Descasco-me a rir com as expressões que empregas, é como se te estivesse a ouvir falar em tom narrativo.

Já imaginaste como responderia a D. Muda ao saber que tinha servido de inspiração para um épico á sua própria pessoa?
Apenas sons(algo parecido com "Obrigado menina")? Gesticularia alguma coisa? Esboçaria um sorriso, ou aquele olhar critico/reprovador?
Não consigo imaginar... e tu?!
Quando passo lá na rua, automaticamente me saltam os olhos para a porta do prédio... quem sabe um dia a encontre e lhe peça um autografo... afinal de contas não é todos os dias que vemos um pivot da TVI ao nosso lado :)

Não pares de criar!