quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Dia Internacional de Combate à Violência Contra as Mulheres


Eu disse que não e ele queimou-me uma ponta de cigarro no meio do peito. Não chorei.
Chicoteei-lhe o olhar com o meu olhar ferido e ele riu-se à gargalhada deixando os podres dentes da frente à mercê da minha ira. Não lhe bati.
Enquanto me sacudia toda pelos ombros e me chamava cabra eu lembrava-me da candura dos meus quinze anos, de sonhar com um rapaz que se enamorasse de mim, ajoelhasse o seu amor eterno, beijos quentes e demorados em noites de lua quando as promessas se espelham nas ondas prateadas do mar.
A sua mão corpulenta de veias grossas e dedos calejados agarrou-me a nuca pelos cabelos, girou a minha cabeça para a esquerda como se estivesse a abrir um molho de conserva com tampa ferrugenta de rosca. Senti algo de muito frágil quebrar-se no meu pescoço. Com a outra mão arqueou as minhas costas em cima da mesa da cozinha, rasgou-me a saia com um puxão e do pulsar quente se fez gelo, da voluptuosa carne se fez mofo. Não reagi.
De repente fomos surpreendidos pela nossa filha de sete anos: outra vez, pai? E ao virar as costas apresentou-me a minha Revolta, a minha Ira, a minha Raiva.


Então despertei. E em plena consciência Agi!

Foto: acordabrasil.



7 comentários:

Sarabudja disse...

Às Marias de óculos de sol e dores na alma

Se lhe dessem uma faca bem amolada e ele a espetasse na minha carne, doer-me-ia bem menos.
Não basta ignorar durante dias a fio, cozinhando em lume brando esta infelicidade. Há que apedrejar com palavras duras o meu esforço natural de querer ser feliz.

Acho que chorei mares de tristezas guardadas, tentei colar com cuspo o meu coração partido, gritei soluções, esperei que as promessas não fossem de campanha.
Já outras vezes vi estes filmes. Outras vezes achei que depois as noticias contam coisas bem piores que estas dores de alma.
Continuo sempre ali. Ali fico aninhada à espera de um fim. Um fim do nó na garganta e dor no meu bem me querer.
Raramente me fala. Raramente me grita. Os dias passam em silêncio. Os dias adormecem em silêncio, e o silêncio profundo os acorda.
Sussurra-me defeitos. Atirá-los delicadamente ao meu espelho é bem mais prazeroso do que publicá-los em jornais de amigos e conhecidos.
Puxo conversa. Abro sorrisos. Falo de coisas que têm que ser resolvidas. Mostro o cansaço de resolver tudo. Fica tudo por resolver. Continua tudo para eu resolver!
Um dia resolvo ser mais resolvida, como se diz por aí. Digo isto há tantos dias, resolvo dias e não resolvo isto.
Dou-lhe a faca. Amolo-a. Há-de doer bem menos.
Deixem-no cravar fundo a carne, deixem que talvez isso me desperte, me mate menos do que esta certeza com que ele me engana.
A carne cicatriza, com certeza.
Dentro tenho pouco: espécie de chaga, lâmpada com pó.
Resolvo dias e não resolvo isto. Amolo a faca. Deixo-a na janela, se o vento a não levar há-de doer-lhe bem fundo!

Unknown disse...

Nossa Sara o teu comentário merece um post. rss :D

Sarabudja disse...

Tidi, o senhor anda desatento. O meu comentário é um post do meu Sarabudjadeideias. Aiiiiiiii

Unknown disse...

Lindo, comovente e inspirador. O texto original e o comentário que veio depois. Obirgado.

Unknown disse...

muito forte minhokinha. Parabéns pela força do texto e pelas imagens que evocas-te na minha mente. Há que despertar e agir!

Minhokinha disse...

Sara, foi um privilégio publicar o teu comentário. Esse tipo de violência é tão ou mais comum do que aquele que procurei descrever. Muito obrigada!

Obrigada por continuares a passar por aqui e deixar recado, João.

Quanto a ti, Tidi, disseste tudo: há que despertar e agir! Sobretudo deixar de fazer de conta que não é nada connosco.

Só espero que a mensagem deste dia não passe em branco.

Abraços*

Al-Qaerva disse...

Gostei muito!

"Então despertei. E em plena consciência Agi!"


What a slap =)


Activista para sempre! Very proud***