domingo, 20 de setembro de 2009

O Salto


Quinta-feira, 17 de Setembro de 2009


Enfim Itália! Maria sorriu quando ouviu a voz metálico-anasalada de um dos membros da tripulação anunciar a aproximação ao aeroporto Ciampino, em Roma. Os passageiros deveriam naquele momento apertar os cintos de segurança, endireitar as costas das cadeiras e as mesas. Reparou que duas filas à sua frente, José levantava o dedo para chamar a hospedeira de bordo. Do fundo do corredor estreito apareceu, em compasso, o sorriso inflamado e impecavelmente trajado de vermelho e verde que, ao deter-se junto do passageiro número 27, logo se sumiu dando lugar à encenada expressão azeda Lamentamos, mas não servimos bebidas alcoólicas a bordo. Maria viu a mão direita de José chegar ao topo da sua cabeça e mecanicamente alisar o cabelo na direcção da testa. Três vezes. Ouviu um longo suspiro que lhe pareceu ser o dele e fechou os olhos. Pôs o i-pod a tocar La Revancha del Tango.

Por fim aterraram e José sentiu um enorme alívio que não quis admitir nem a si próprio. Continuava a ter medo de viajar de avião. Enquanto esperavam as respectivas bagagens miraram-se sem grande interesse, cada um imerso nos seus fúteis pensamentos: Maria questionava se a sua mala chegaria sem atrasos e José só pensava em fumar um cigarro. Se tivessem saído ao mesmo tempo e enfrentado a multidão expectante de familiares, amigos e cartazes com variados nomes saberiam que nenhum dos dois tinha ali alguém à sua espera.

Não foi difícil encontrar o bus que levaria os passageiros daquele voo à estação de autocarros de Fiumicino, e mais uma vez José reparou em Maria, sentada num dos lugares da janela, com auscultadores nos ouvidos, cabeça amparada no vidro e olhos fechados em brilho de raios de luz. Parecia murmurar algo em tom de melodia mas ele não parou para ouvir. Roma é Aroma e Amor, pensou Maria enquanto o autocarro entrava por mais uma rua plena de assimétricas varandas de vasos coloridos e portentosos cães passeados em trela Givenchy.
O cheiro morno de estação de autocarros, uma massa atarefada em sacos cheios e malas de rodinhas a cortar o chão, filas de espera ora de risos ora de rostos sisudos, de novos e velhos, de nacionais e estrangeiros, de corrida desenfreada até ao último segundo em que a porta já se reabre paciente. No momento em que José se colocava no último lugar da fila para a casa de banho, Maria pedia uma fatia de pizza napolitana e um copo de Montepulciano na estação ferroviária em frente contemplando, absorta, o vai e vem de combóios frenéticos, audazes e violentos que se cruzavam indiferentes perante si enquanto placidamente mastigava o Parmeggiano-Reggiano. É como ver o mundo todo a girar.
Quando a voz rouca de metal chamou para o autobus delle sete e trenta e os passageiros começaram a embarcar, Maria e José já se olharam com um sorriso como se fossem amigos. Iam para a mesma cidadezinha perdida no meio da bota, Roseto Degli Abruzzi.

5 comentários:

Catarina disse...

Montepulciano... nem imaginas o catapultar de memórias que esse vinho me trouxe lollllll - ainda bem que voltaste... já estava com saudades!

Sarabudja disse...

Bom dia!
Amanhecer assim custa menos. És responsável por um sorriso ensonado.
Boa semana Minhokinha.

Ana Rita disse...

Hummm...assim sim...não pares!kiss

Anónimo disse...

Fico à espera de mais para recordar Itália.
Tanti Bacci!

Ana (Porto-Terni)

GreenHouseSpecial disse...

keep on writing... and keep it green ;)