domingo, 26 de julho de 2009

Glimpses


Decidiu entrar naquele quarto sem fazer barulho. Os ritmos tribais descontrolados do seu coração ouvia-os na alma, bem mais alto do que o ligeiro ranger da porta de madeira ao abrir. Contemplou a escuridão antes de se embrenhar nela e ainda teve tempo de sentir o odor que as roupas deixadas ao acaso exalavam. Cheiro de música dançada até de manhã, de gotas de whisky que se derramaram, de gargalhadas ébrias. Deu um passo leve, quase suspenso numa nuvem, e enfim entrou naquele quarto onde o seu riso e suor ainda escorriam das paredes. Girou o pescoço para a esquerda, os poucos riscos de luz que a persiana quase fechada permitia que cruzassem aquela escuridão deram-lhe a ver os quadros na parede, o pequeno móvel de madeira com livros, a porta do guarda-vestidos aberta por onde espreitavam mangas de camisas raramente usadas. Sorriu. À direita mal se percebia o desenho da negra que rasgava a parede amarela, por baixo a mesinha de cabeceira: dois maços de cigarros, um relógio de pulso e um copo de vidro vazio. Em frente à persiana mal fechada, quase encostado à cortina, aquele vulto enrolado nos seus sonhos, boca aberta de bebé de onde, mesmo a dormir profundamente, espreitava um sorriso. Demorou-se a contemplá-lo, queria pegá-lo ao colo para sempre. Em vez disso sentou-se ao seu lado, as molas da cama não emitiram qualquer som, cúmplices daquele vislumbre secreto. Encostou a palma da sua mão direita à bochecha dele e esperou que acordasse. Quando abriu os olhos pensou que continuava a sonhar. Abriu o sorriso mais belo de sempre!

5 comentários:

Catarina disse...

:-)

Unknown disse...

mistérioso mas evocas um momento interessante. quase filme. bjos.

Sarabudja disse...

Hoje vi uma boa entrevista, já ouvi uma música fantástica e li este teu, como chamar-lhe(?), derrete mamãs.
É por isto, e por mais milhentas coisas, que eu abro este teu espaço com a certeza de que me vou deliciar.
Beijos.
Mantém-te por perto

Cesar Schofield Cardoso disse...

Quando se lê as coisas de um sorvo, como um sumo de fruta fresca, revela que foram preparadas com cuidado: as doses certas, um pouco de água, não precisa pôr açucar, deixar a gelar no frigorífico e servir. Fresquinho!

Anónimo disse...

Que lindo!
Obrigada!

Catarina C.