sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Meu dedo do meio da mão


O meu umbigo queria rasgar o ventre, aquele lugar berço que almofada o mundo. Queria continuar a fazer de conta que não ouve, que não vê, que não sabe. Não sente.
Deixou de poder sentar-se mais (ainda) na poltrona e levantou-se. Olhou em frente, declarou: Hoje vou ser feliz!

Imune às boas intenções deste mundo e do outro (daquelas que enchem o Inferno) abriu um sorriso que gritava não as suportar. Era para o seu bem, asseguravam-lhe, e o que tem de ser tem muita força… com a leveza de uma ida ao café. Tentava fugir, saltava telhados de perigos obscuros, fintava as rasteiras que despontavam dos pézinhos maldosamente colocados à sua frente, arfava como se estivesse a cortar a meta dos 300 metros em primeiro lugar, mas as boas intenções deste mundo e do outro continuavam coladas a si com os caninos de fora e a baba raivosa dos cães a escorrer-lhes pelo queixo.

De repente uma luz. Deixou de correr. Virou-se para trás e mandou-as foder. Sim, foder, sem tirar nem pôr. Momentânea branca de lirismos e obséquios.

E então voou! As suas asas de papel pousaram-no naquele areal onde os grãos queimam a palma. E tatuam os pés. Sorriu para o Sol. Finalmente!

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

A Vibe X-Mas to you all

Quem conhece a Minhokinha sabe que o caríssimo Tó Pereira é um dos meus mestres na área da música. Assim, cá fica um mimo que não me canso de rever (Dj Vibe na festa de Halloween, em 2007) e que gostaria de partilhar com os fãs. Um especial beijinho à Margarida que descobri recentemente ser também uma "agarrada" à batida!

Feliz Natal para todos!

domingo, 7 de dezembro de 2008

O Bracarense


Diga-se o que se disser, há coisas que simplesmente não podem ser contestadas e uma delas, doa a quem doer, é que Braga é uma cidade rica. Rica em igrejas e em vasta representação clerical, rica em prédios berrantes que surgem mais íntimos do que vizinhos, rica em túneis quilométricos, em pudim abade de priscos e frigideiras do cantinho, rica em papas de sarrabulho como não há em mais lado nenhum, rica em estudantes de tricórnio, em BMW’s e, claro, rica em parolos polidos. O parolo polido está para Braga como as Carrie Bradshaw’s estão para Manhattan e as mulheres de boina de lado para Paris. Enquanto o parolo assumido grita ao mundo "Sou parolo", o segundo gosta de se camuflar e dar a conhecer aquilo que na verdade não é. Vejamos.
Do subtipo parolo polido, o macho sénior é aquele que dá a impressão de ser um verdadeiro entendido em todas as matérias, não há nenhum assunto que escape à sua omnisciência e a prova disso é a sua proeminente barriguinha que já viu muito mundo, já comeu de tudo o que havia para comer, tendo portanto alcançado, e com mérito, o estatuto de homo sapiens vividus. A voz é funda e basofa, empoleirada na garganta qual galo no poleiro e condiz na perfeição com o BMW ou o Mercedes (não os últimos modelos, nem sequer muito modernos, mas as típicas banheiras do século passado) que ostenta avenida abaixo, a 18km por hora para todos o poderem admirar. Veste-se com as marcas tidas como chiques que a senhora dona esposa obriga e dá facadinhas na dita com a secretária (ou qualquer rapariga com menos de quarto de século que tenha em vista um bom VISA-Prendas-Sempre-Que-A-Menina-Faz-Beicinho). Tem um casarão, claro está, com comandos para tudo e mais alguma coisa, imponentes esculturas, bustos e quadros com molduras douradas extremamente pesadas e gosta de assassinar a casa de banho principal com azulejos pretos e banheira redonda como a senhora dona esposa viu numa revista que documentava, com a seriedade característica da imprensa cor de rosinha, a casa de Luciana Abreu.
Se dúvidas existissem sobre como detectar uma parola polida sénior (Onde está o Wally? por entre a bicharada bracarense), a pista primeira e óbvia seria a quantidade de base que este subtipo insiste em colocar na sua face. Aquela base escura e plástica, substancialmente diferente do seu natural tom de pele, a querer dar o ar "fui ali às Caraíbas passar uns dias e já voltei". As suas roupas são caríssimas pois acredita piamente que a imagem exterior reflecte a interior, por isso faz questão de gastar quantias consideráveis do seu dinheiro (salário? Rendimento? Pensão? Um mistério!) em roupas que considera de alto nível. Quer dizer, a parola sabe que nunca almejará ao nível cimeiro da haute couture, tem consciência de que nem que trabalhe (faça render? Faça lucrar? Outro mistério!) dez anos inteiros sem comer conseguirá juntar o dinheiro suficiente para um guarda-roupa totalmente forrado a Roberto Cavalli, Versace, Dior ou Yves Saint-Laurent. Assim, contenta-se com as griffes mais em conta, uma Massimo Dutti, uma Lanidor, por vezes a loucura dum Augustus mas sempre, incontestável e impreterivelmente, uma devoção cega pela Salsa e pela Ana Sousa. Ornamenta-se com um sem número de anéis, pulseiras e colares de medalhões de um ouro extremamente amarelo e antigo, ouro das nossas bisavós, pedras preciosas gigantes a ferir a vista, maquilhagem berrante, verde e azul obrigatórios a colorir os olhos. Finaliza com muita laca no cabelo para aguentar qualquer tempestade ciclónica e uma raposa morta ao pescoço by João Caçador. No hard feelings!
A jovem fêmea do subtipo em análise distingue-se da sénior fundamentalmente por ter menor capacidade económica, ou seja, faz da Stradivarius, H&M, Bershka e afins as suas igrejas. E Salsa. Sempre. Para ela a classe está nos pormenores, por isso dedica incontáveis horas, dias inteiros, à decoração das suas longas unhas de silicone rosa-choque com efeitos Floribela, às madeixas de várias tonalidades de louro e aos cintos dourados e prateados com berloques que fazem lembrar os sinos das igrejas. Base qb, bota de tacão, cigarro na mão, pinta de lojista, calça justa no rabo, pose de boa. A jovem parola polida gosta de expressões que considera reveladoras de considerável cultura como "fulano não tem perfil para qualquer coisa" ou a sempre pronta na língua "Eu a mim parece-me que" só substituída por "Eu para mim tenho que…". De vez em quando escorrega nos tempos verbais mas, sejamos justos, esta deficiente conjugação verbal é transversal a todas as idades e géneros do parolo polido. Os mais jovens já conseguem travar a tempo o "eu foi" e "eu esteve", sendo este exercício consideravelmente mais difícil para os mais velhos. Todos quase sem excepção fazem questão absoluta de ridiculamente conjugar a segunda pessoa do pretérito perfeito, criando frases tão belas quão repugnantes como "Ó Lizete, fostes à médica, fostes? Dissestes que te dói muito os rins, dissestes? E fizestes o que ela te mandou, fizestes? Tu bê lá… ó Lizete!"
Não há grande coisa a acrescentar ao parolo polido macho da camada jovem. É aquele com quem mais nos cruzamos na rua, o que atende o telefone com um "Ou" sonoro em vez de Sim ou está ou ainda pode falar. Se estivermos na dúvida se estamos perante um, não nos devemos deixar enganar. O parolo assumido tem o mesmo aspecto, é certo, mas o polido enriquece o seu look com umas t-shirts justas que gritam De Puta Madre com brilhantes a condizer, umas calças que abanam Rich ou Gorgeous no ass e lá vão eles com aquele ar de garanhão a assobiar as miúdas e a dizer coisas como "Ainda dizem que as flores não andam", comentários mais requintados sem a vulgaridade do "Comia-te toda já aqui"… enfim, são jovens que, de uma forma ou outra, se civilizaram em relação aos seus primos parolos assumidos e quando voltam para a aldeia-mãe, já no final de mais um dia, os olham com desdém como um Imperador encara os seus súbditos.

Fica este estudo completo no que concerne o parolo nas suas mais variadas vertentes. Proceder-se-á, de seguida, à análise do mediano, o normal, vulgo pãozinho-sem-sal.